«(…) as pessoas religiosas, especialmente aquelas que vivem na América e no mundo islâmico estão habituados que seja feito tudo à sua maneira. E são extremamente intolerantes para com os ateus» Richard Dawkins in CNN “Atheists in America”
Será que existem ateus igualmente intolerantes para com a religião e os dogmas da mesma? Obviamente que sim e não precisamos de ir longe para encontrar um particular exemplo dessa intolerância. Claro está que falo do meu fundamentalista ateu “preferido”.
Richard Dawkins numa das suas muitas palestras em que prefere falar dos defeitos da religião que as virtudes do ateísmo dá uma, muito pessoal, interpretação dos escritos sagrados dos judeus (Torah) e cristãos (Velho Testamento).
Ele dá o exemplo de um castigo aplicado pela profanação do dia sagrado do Shabat a alguém que é encontrado a apanhar lenha no dia de descanço obrigatório. Curiosamente, faz menção que ao longo de todo o livro os hebreus são avisados por D’us, que não deverão fazer qualquer trabalho (em hebraico – melachah) nesse dia. De facto é bem verdade que não só D’us avisa que não poderão fazer qualquer trabalho nesse dia, como deixa bem claro qual o castigo para tal transgressão - a Morte.
Parece muito duro que D’us Todo-Poderoso e Misericordioso possa aplicar este castigo, principalmente para a compreensão do moderno mundo ocidental. Mas se pensarmos de um ponto de vista pragmático devemos ter em consideração que os hebreus tinham nessa altura aceite um pacto eterno para com D’us desde a Revelação no Sinai. As “regras do jogo” tinham sido acordadas por ambas as partes e quem não estivesse de acordo poderia sair desse mesmo pacto à partida. Uma lição de democracia.
Mas Dawkins não aprofunda o tema como é seu apanágio. Prefere continuar a sua hipnótica palestra da “Religião e os seus males” sem que certas explicações sejam dadas e contextualizadas.
Mas, certamente que Dawkins também sabe o Judaísmo é uma religião rabínica e não bíblica. Isto é, baseada nas interpretações dos maiores sábios judaicos, ao longo da sua vasta história, da Torah e o restante Tanach (Bíblia Hebraica).
Será que Dawkins deu atenção a alguma dessas interpretações, ou limitou-se a ler um texto que, sem as devidas interpretações, pode transformar a palavra divina em algo arcaico e aterrador?
Declaradamente apesar de académico, escolheu a via mais simples e rápida e deixa as interpretações finais para si próprio. Afinal ele tem sempre razão… certo?!
Rashi (Rabino Shlomo Ytzchaki), o exegeta francês do século XI da Era Comum interpreta a passagem depois de um intenso estudo e leitura da Lei escrita (Torah) e da Lei Oral (Mishná) e sobre os versículo descrito escreve o seguinte:
«Aqueles que o encontraram avisaram-no que parasse de profanar o Shabat, mas este não parou de juntar a lenha mesmo depois de ser encontrado a fazê-lo e ser avisado do seu erro.» Sanhedrin 90a, Sifrei Shelach 55
Acontece que isto é normativo para a Lei Judaica (Halachá), mas Dawkins não achou importante realçar. Preferiu “cómicamente” realçar o “mau humor” de D’us naquele dia: "D’us não estava para meias-medidas naquele dia".
Também não mencionou que no versículo imediato a este acontecimento, D’us, apesar de ter deixado bem claro – uma vez mais - com o exemplo capital que hebreus que não deveriam trabalhar no Shabat sob pena de morte, ordena aos mesmos que coloquem franjas nos cantos da roupa (tzitzit – recordatórios dos 613 mandamentos) de forma a que estes sem lembrem do cumprimento das mitzvoth (mandamentos - preceitos judaicos).
Recorrendo ao sentimentalismo barato e a um moralismo simplório Dawkins prefere divagar: "Será que esse pobre apanhador de lenha tinha mulher e filhos para chorar por ele?"
Mas se preferem as interpretações de Dawkins à de Rashi e de todos os grandes comentadores da Torah ao longo dos tempos pergunto: Que ideia estará Dawkins a dar de D’us, do seu Povo e do seu Livro, com a sua interpretação?
Na minha opinião, perguntem a um anti-semita, pois ele certamente terá a resposta.