Quinta-feira, 16 de Outubro de 2008

Foto © Israel Bardugo
 
Nesta foto de Israel Bardugo, podem-se ver os Judeus de Kinshasa, no Congo, a rezar o serviço nocturno de Arvit logo após o final do Yom Kipur.
 
Uma imagem semelhante à de todas as outras sinagogas em todo mundo, apesar da piada clássica sobre as sinagogas reformistas (1). A grande diferença será que nesta sinagoga, como todas as do movimento Chabad-Lubavitch, os congregantes não tiveram de pagar bilhete para participar nos serviços religiosos, ao contrário da grande maioria nos Estados Unidos e Europa.
 
Ninguém sabe ao certo como começou esta “moda” de cobrar bilhetes para os Yamim Noraim (2) , mas os responsáveis deste movimento hassidico tem a explicação para que não se pague. É simples, um Judeu não deve pagar para rezar, afinal de contas é o seu papel! Um Judeu “pertence” à sinagoga durante estes dias, seja qual for a afiliação ou condição social.
 
Há quem diga que a “moda” de cobrar bilhetes nestes dias se deve ao facto deste ser o único dia que a grande maioria da comunidade judaica global vai à sinagoga. Uma vez que não tem a “oportunidade” de fazer tzedakah (3) noutra altura, criou-se esta forma de dar este privilégio aos Judeus mais “baldas” da sinagoga.
 
Será que a moda pega em Lisboa? Eu, confesso que ouvi por trás de mim alguém dizer no fim do serviço “Então até p’ro ano”.
 
PS: Na brilhante série de Larry David “Curb your Enthusiasm”, fizeram uma paródia sobre a dinâmica da venda de bilhetes para Yamim Noraim. O movimento Chabad-Lubavitch aproveitou a deixa. Assistam aqui:
 
NOTAS:
 
(1) A piada reza assim: “Que diz à porta de um templo reformista nos Yamim Noraim?” Resposta: “Fechado para férias” [Os Judeus reformistas costumam chamar as sinagogas de templo]
 
(2) ‘Grandes Festas’ ou literalmente ‘Dias de Temor’ [Yom Kippur e Rosh Hashaná]
 
(3) contribuição monetária para caridade/justiça


publicado por Marco Moreira às 02:34
Domingo, 05 de Outubro de 2008

 

Foi o segundo debate mais visto de sempre com 73 milhões de telespectadores. Destronando o debate entre os principais intervenientes, McCain e Obama, por mais de 20 milhões de pessoas acabou por ser um debate morno, sem “gaffes” e sem grandes motivos para reivindicar vitórias uma vez que não conseguiram ser totalmente frontais e de salientar as soluções fundamentais que ambos defendem.

 
Mas antes uma introdução:
 
A escolha de Palin para “vice” republicana, que a principio mostrou ter sido uma jogada de mestre de McCain, foi aos poucos perdendo o brilho, muito por força dos media liberais que exaustivamente a acusaram de falsa moralista, fundamentalista evangélica e ignorante.
 
Apesar de não transpirar o estigma de 2ª escolha, Palin acabou por ser a surpresa necessária depois de nomes seguros e experientes não se perfilarem como disponíveis, como Joe Lieberman e Condoleezza Rice. Foi o trunfo na manga de McCain e no overall não se pode dizer que os media a tenham destruído, mas de facto tornaram-na mais frágil. Talvez por isso, esta se mostre mais populista e menos popular com tiques que chegam a roçar o parolo e pacóvio, como o sorriso que termina num piscar de olhos para a câmara e um acenar da cabeça vitorioso. Por vezes dei por mim a pensar em Ned Flanders, o beato da série “Simpsons”, pelos gestos quase plagiados. Mas de facto Ned, tal como Palin, é um cidadão exemplar, que paga os impostos, trabalhador, familiar e fervoroso religioso que defende a máxima do dollar “In God we Trust”. Algum problema nisso!?
 
Se Palin se mostrou frágil na política internacional e ignorante do ponto de vista geográfico, os democratas não podem estar muito à vontade com o seu “vice” Joe Biden. Ao longo dos anos este revelou-se um dos maiores “gaffeiros” da política americana, ao nível o campeão George W. Bush. É conhecido pelas piadas sexistas e racistas que deixam os americanos boquiabertos com a falta de timing e moderação. Na Europa talvez não fosse problema, mas no país que inventou termos como african american e little people, Biden está a um passo do abismo cada vez que abre a boca.
 
É um homem do aparelho democrático, escolhido cirurgicamente para apoiar Obama devido à sua falta de experiência, que curiosamente, o próprio fez questão de salientar quando ainda era seu adversário nas primárias democráticas.
 
Estamos então perante a “Energia e Entusiasmo Patriótico” de Palin vs. a “Experiência e Qualificação Internacional” de Biden.
 
O debate começa com um Biden mais seguro mas sem grandes soluções. A estratégia é ligar o actual presidente com McCain e defende que a vitória deste não vai trazer novidades. Defende a construção de políticas económicas e acusa os republicanos dos aumentos fiscais enumerando os seus maiores erros nesse campo. Foca a importância da classe média e defende a aposta nas energias alternativas.
 
Palin ainda pouco à vontade, refugiou-se nos exemplos populares da vida familiar e das suas dificuldades diárias. Promete reformas económicas e travar o seu ódio de estimação a nível interno: “A corrupção e ganância de Wall Street”. – que mencionou três vezes durante o debate.
 
Defende-se com o facto de o próprio Obama apoiar os mesmos aumentos fiscais e promete lutar para eliminar as diferenças na assistência social.
 
Ambos não apoiam o casamento homossexual. Biden defendeu a união de facto e igualdade fiscal entre “casais do mesmo sexo”. Palin falou em tolerância.
 
À medida que o debate avança, Palin mostra-se mais confiante e revela o seu sentido prático e real dos problemas de política externa dos Estados Unidos, curiosamente uma dos suas fraquezas.
 
Enquanto Biden qualifica o Paquistão e o Irão como problemas similares aos quais terão importância idêntica na agenda democrática, Palin defende uma maior atenção ao Irão e faz menção ao seu maior aliado: Israel. Biden começa a tornar-se utópico na defesa do diálogo enquanto Palin salienta que a América não deverá ter diálogo com os seus inimigos e com ditadores. Biden defende uma diplomacia musculada de apoio a Israel e defende o avanço das tropas da NATO no Líbano. Palin por sua vez defende a solução de dois estados (Israel e Palestina) e volta a frisar o apoio a Israel referindo que “não vamos permitir um segundo Holocausto”.
 
Relativamente ao problema no Darfur concordam na sua totalidade mas perdem pouco tempo a falar do mesmo, principalmente por culpa da moderadora.
 
Relativamente ao papel que cada um vai ter nas relativas administrações, Biden revela que terá liberdade de opinião sobre todos os assuntos do país enquanto Palin por sua vez irá liderar em certos pontos.
 
No final dá-se um empate técnico, muito por “culpa” dos intervenientes. Palin não se revelou “parola” e Biden não se revelou sexista. Foram ambos muito correctos e preferiram não enveredar pelo caminho da acusação barata e moralista. Talvez porque ambos tenham “telhados de vidro”… Mas quem não os tem?!
 
Parabéns pelo nível. Mas o debate foi fraquinho (assim como a minha análise). Mas que fazer quando a matéria prima não é de grande qualidade?!


publicado por Marco Moreira às 01:47
Quarta-feira, 01 de Outubro de 2008
Artigo gentilmente enviado por Samuel Levy, baseado no escrito original do Rabino Benjamin Blech na revista “World Jewish Digest”. Tradução e edição em português: Marco Moreyra
 
No coração do Vaticano, a Capela Sistina é o local de conclave onde todos os novos Papas são eleitos. É sem dúvida a capela mais sagrada no mundo Cristão, e atrai mais de 4 milhões de visitantes por ano. Maior parte conhece-a melhor pelos seus frescos magníficos pintados pelo grande artista do Renascimento, Michelangelo Buonarroti. No entanto, o que se manteve como um segredo pouco conhecido, é que nesta cidadela do Cristianismo jaze provavelmente o maior acto subversivo na história da arte.
 
Quase nenhum dos visitantes que entra na Capela Sistina se apercebe que estão diante de mensagens secretas embutidas por Michelangelo na sua artística obra-prima. Ficariam certamente surpreendidos por ficar a saber que, na Capela do próprio Papa, Michelangelo empregou mensagens secretas que defendem uma mudança revolucionária nas relações do Cristianismo com o Judaísmo, e que o próprio código está enraizado na tradição Judaica.
 
 
Michelangelo tornou-se um fascinado pelo Midrash e pela Kabbalah enquanto adolescente, estudando com tutores providenciados pelo seu protector, Lorenzo de’ Medici. Utilizando o seu conhecimento do Judaísmo e os seus símbolos místicos, mais tarde incorporou mensagens nas imagens pintadas, nas paredes da capela, perigosamente contrárias aos ensinamentos da Igreja. Desta forma, criticou o corrupto líder espiritual da altura, e condenou o fracasso da Igreja no reconhecimento da sua dívida às origens judaicas.
 
Expressado 500 anos antes da teologia contemporânea mais liberal de João Paulo II e do “Bom Papa”, João XXIII, a descoberta deste código secreto e visões heréticas poderiam ter custado a vida a Michelangelo.
 
Quem reclamou estas reivindicações primeiramente foi Roy Doliner, um docente judeu e estudante de ciências humanas que liderava excursões à Capela Sistina à cerca de uma década e na altura pareciam incríveis demais para serem verdadeiras. Só depois de partilhar com o Rabino Benjamim Blech a sua pesquisa diligente o convenceu da sua legitimidade.
 
O Rabino Blech escreveu em conjunto com Doliner o livro “The Sistine Secrets: Michelangelo’s Forbidden Messages in the Heart of the Vatican“, que foi editado (em inglês) este ano. Para delicia dos autores, o livro está já a começar a alterar a forma de interpretação de estudiosos do trabalho de Michelangelo, reluzindo vigorosos, e por vezes quentes debates.
 
“Da mesma maneira que o trabalho de Michelangelo na Capela de Sistina mudou o mundo da arte para sempre, este livro mudará também a forma de ver e, acima de tudo, compreender o trabalho de Michelangelo” disse Enrico Bruschini, Historiador de arte da Embaixada Americana em Roma e perito principal em Arte de Roma e do Vaticano.
 
Um verdadeiro homem do Renascimento, Michelangelo estava na filosofia tal como na arte; na teologia Cristã, bem como no misticismo Judaico. No entanto, aqueles que estudaram o seu trabalho no passado geralmente não estavam familiarizados com o largo corpo de conhecimento que o forjou enquanto artista. Maior parte dos estudiosos da Capela Sistina não eram bem versados em Judaísmo e Kabbalah; era impossível para eles decifrar na totalidade as alusões do artista. Combinando a bolsa de estudos das respectivas áreas dos autores, o docente e o rabino ortodoxo, conseguiram descortinar segredos à muito enterrados nos frescos de Michelangelo.
 
Desde o principio, Michelangelo tinha uma agenda pessoal diferente da do seu protector. Em 1508, sabemos que o Papa Julio II ordenou Michelangelo de voltar a engessar e pintar o tecto esmigalhado da Capela Sistina, um trabalho humilhador na altura para qualquer grande artista, em especial Michelangelo, que detestava pintar e vivia somente para esculpir. O Papa deu-lhe um desígnio simples, um plano padrão e banal de Jesus e Maria nos dois extremos do tecto, rodeado pelos Apóstolos e um design comum de formas geométricas no centro. O artista recusou, e lutou com o Papa que, doente e distraído, finalmente o deixou desenvolver o seu próprio plano.
 
Imaginem a surpresa do Papo e restantes quando, completado o projecto foi desvendado quatro anos e meio mais tarde. Noventa e cinco porcento da Capela foi adornada com herois e heroinas da Biblia Hebraica. O restante foi preenchido com sibilos pagãos e meninos nus.
 
Nos 1115 metros quadrados do maior fresco do mundo, não havia uma única figura Cristã. O único aceno aos Evangelhos – e uma das formas que Michelangelo conseguiu salvar a sua vida e trabalho – foi uma quase imperceptível serie de nomes dos antepassados judeus de Jesus que nem sequer aparecem em ordem cronológica. Porque queria Michelangelo desobedecer ao Papa desta forma?
 
Michelangelo tinha um intuito escondido: lembrar a Igreja que as suas raízes estavam baseadas na Torah dada ao povo Judeu. Esta perspicácia que inseriu ao longo do seu trabalho, está somente agora a receber a devida atenção no estudo contemporâneo. Está a aparecer também na imprensa popular. A revista “Time”, no artigo de 24 de Março (versão americana) que é dada capa “10 ideias que estão a mudar o mundo”, anotou que os estudiosos chamam agora a “Re-Judaização de Jesus” como a ideia mais poderosa no campo da religião.
 
Os frescos de Michelangelo enfatizam a universalidade de Deus e o parentesco de todo o género humano começando a narrativa pictórica com a história da Criação de Genesis, não com o nascimento de Jesus. A uma Igreja que orou “exclusionismo” e deu ênfase ao Amor Divino por um só número limitado das crianças dele, Michelangelo enfatizou tolerância de todas as fés, até mesmo os judeus menosprezados do seu tempo.
 
Um fresco que exemplifica esta ideia é o retrato de Aminadab, pai de Nachshon que aparece sobre a área elevada onde o Papa colocou o seu trono. Estudantes hebreus sabem que o significado do nome hebreu de Aminadab, “do meu povo, um príncipe.” Mas a Igreja interpreta “príncipe dos Judeus” para se referir directamente a Jesus. Michelangelo posicionou Aminadab, “Príncipe dos Judeus”, como substituto para o próprio Jesus.
 
Esta é uma das figuras extremamente raras pintadas por Michelangelo sentado perfeitamente direito, olhando em frente, um sinal pelo artista que a figura é, realmente, notável. Além disso, um círculo amarelo luminoso, um anel de pano cosido sobre um artigo de vestuário aparece na parte superior do braço esquerdo de Aminadab. (Este detalhe não foi revelado para as audiências modernas até que os frescos fossem restabelecidos em 2001.) Este remendo exibe o distintivo de vergonha forçado nos judeus de Europa pelo Quarto Conselho de Lateran em 1215 e na Inquisição durante o Século XXV. Aqui, directamente em cima da cabeça do Papa, o Vigário de Cristo, Michelangelo estava a lembrar a Igreja que Jesus era um judeu. Ele condenava a mesma pelo tratamento vergonhoso para com os judeus, de quem nasceu Jesus.
 
Esta era uma declaração corajosa. As mensagens veladas dele foram pintadas no momento em que o Talmud e outros textos sagrados judaicos eram queimados por toda a Europa, a Inquisição operava em força total e o povo Judeu há pouco havia sido expulso de Espanha em 1492. Michelangelo teve a coragem para desafiar o tribunal papal, enquanto perguntava por via dos símbolos da sua pintura: “É assim que se trata a família de Nosso Senhor?”
 
O desprezo de Michelangelo pelo tratamento da Igreja para com os Judeus mais adiante foi insultar o próprio Papa com o gesto quase imperceptível de Aminadab. Quase escondido na sombra, este substituto para Jesus está subtilmente a fazer os “chifres do diabo” com os dedos que apontam para baixo para a mesma mancha onde o pálio cerimonial ricamente bordado do Papa Julio haveria estado, por cima do trono papal.
 
De forma um pouco semelhante, num outro fresco colocado em cima do portal da capela original pelo qual Papa Julio entrou, Michelangelo descreve o profeta Zechariah com a própria face do papa. Por cima o ombro pode-se ver um pequeno anjo com os dedos enrolados para fazer um gesto obsceno conhecido na Itália de certo modo como “dando o figo.”
 
No simbolísmo dos frescos da Capela Sistina, em vez de vergonha e perseguição, inclusão e reconhecimento do Favor Divino estão as qualidades que Michelangelo defende para o tratamento da Igreja para com os Judeus. Temos até uma indicação mais poderosa do filo-semitismo de Michelangelo no trabalho posterior dele, “O Último Julgamento.”
 
Nele, posa um anjo dourado cabeludo vestido em vermelho directamente em cima da cabeça de Jesus e aponta para dois homens dentro de um grupo conhecido como as “Almas Íntegras”, uma colecção de figuras que representam aqueles que privilegiaram passar a eternidade num estado de felicidade com Jesus como recompensa pelas suas acções na terra. Michelangelo retracta ambos estes homens como Judeus, um acto potencialmente blasfemo. Um usa um chapéu de duas pontas que a Igreja forçou homens judeus a usar para reforçar o preconceito medieval que os judeus, sendo gerados pelo Diabo, tinham chifres. Esta figura fala a outro Judeu mais velho enquanto aponta para cima, indicando o unicidade de D’us. A outra figura usa um chapéu amarelo da vergonha; durante o século XIII, a Igreja ordenou os homens Judeus na Itália usar tais chapéus em público. Em frente às duas figuras, uma mulher, o cabelo dela recatadamente coberto, sussurra na orelha de uma mocidade nua antes dela. A juventude assemelha-se ao jovem tutor de Michelangelo, Pico della Mirandola que possuiu a maior biblioteca de Kabbalah no mundo e que ensinou ao jovem artista segredos do misticismo judaico que infundiu dentro dele um respeito duradouro pelo povo Judeu.
 
Concedendo aos judeus um lugar no céu com Jesus, no século XVI, Michelangelo tomou uma posição então blasfema num assunto que ainda provoca um debate aquecido entre os Cristãos no século XXI. A representação dele que concede claramente Favor Divino infringiu a doutrina oficial da Igreja que manteve que os judeus nunca podem esperar ter uma recompensa Divina.
 
Michelangelo definiu génio como “paciência eterna”. Neste ano, o 500º aniversário de Michelangelo que começa com o trabalho dele no tecto da Capela Sistina, o seu “código” foi finalmente descoberto e dele pode ser vista a perspicácia, engenhosamente escondida no seu trabalho.


publicado por Marco Moreira às 03:44
 
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